Em um contexto totalmente oposto ao atual momento dos geradores; na transmissão sobram oportunidades de investimento. Nesta semana, a agência reguladora aprovou o edital de mais um mega-leilão. Em 2 de setembro, serão licitados 6.600 km de linhas e 6.750 MWA em capacidade de subestações que, na previsão da Aneel, exigirão R$ 11,8 bilhões em investimentos. Em disputa estarão um contrato de concessão de 30 anos e uma receita que, se somada, pode chegar a R$ 2 bilhões anuais.
“É um leilão desafiador como tem sido os outros”, comentou Claudio Sales, presidente do Instituo Acende Brasil. Ele reconhece que houve evoluções importantes para essa disputa, que na sua visão eram causas dos fracassos anteriores. Destacou o fato do BNDES voltar a financiar até 70% dos projetos e o prazo de até 60 meses para operação das obras como pontos positivos, mas lamentou a redução da taxa de retorno, que caiu de 9,5% para 8,5%. “O risco em relação ao retorno é um ponto que ainda acho ameaçador. Revela que o leilão ainda não se afastou totalmente de uma armadilha… Isso nos deixa com bastante incerteza quanto ao sucesso do leilão.”
É inegável o esforço feito pela equipe da Agência Nacional de Energia Elétrica para tentar atrair novamente os investidores aos certames. Contudo, o problema se mostra muito mais desafiador e se complica a cada novo fracasso. Afinal, lotes vazios comprometem o planejamento e a segurança do sistema ao limitar o escoamento da produção de energia já contrata. A consultora Thais Prandini, diretora da Thymos Energia, lamentou as condições apresentadas no edital e disse que esperava coisa melhor. “Imaginava que haveria alguma metodologia nova, alguma coisa que realmente reestruturasse o leilão. Fizeram apenas pequenos ajustes.” Para ela, o certame não será diferente do realizado em abril, quando cerca de 40% dos lotes não tiveram interessados.
Na opinião de Joisa Dutra, diretora do Centro de Regulação em Infraestrutura da Fundação Getúlio Vargas, o verdadeiro problema dos leilões de transmissão ainda não foi abordado adequadamente. Ela, que já foi diretora da Aneel, reconhece os esforços da agência, mas acredita que uma solução estrutural para os certames precisa ser melhor estudada. A especialista criticou a metodologia de lotes condicionantes e lotes condicionados, pois acha que isso pode prejudicar ainda mais o sucesso da licitação. “Quando o primeiro lote não sai, cai todo o conjunto… Talvez tivessem outros instrumentos.” Joisa, contudo, entende que o setor está em um momento político melhor, com novas pessoas dispostas a enfrentar os problemas.
A decomposição dos empreendimentos em lotes menores foi a estratégia encontrada pela agência para atrair novos investidores, já que as grandes empresas espanholas e a Eletrobras não têm mais figurado nas disputas por conta da difícil capacidade financeira. Segundo Mario Miranda, presidente da Associação Brasileira de Grandes Empresas de Transmissão de Energia Elétrica, a média dos últimos certames tem sido de “meio proponente por lote”, o que mostra a aversão ao risco dos investidores. Para ele, a indefinição em relação as regras de indenização das transmissões e a incerteza quando aos reais riscos de licenciamento ainda prejudicam os negócios nesse segmento.
Por outro lado, Miranda, assim como Sales, elogiaram a subdivisão dos lotes. “A questão da Aneel eleger os projetos condicionantes e condicionados é muito importante, porque mostra que sem determinada obra não adianta dar continuidade a outra. Isso demonstra inteligência nessa aplicação”, disse o presidente da Abrate. “Esse conceito de lotes é uma novidade importante que faz bastante sentido”, concordou Sales.
A reportagem procurou investidores de menor porte para sentir o apetite do mercado. A diretora Comercial da espanhola Cymi Masa, Tatiana Vaccani, que conquistou projetos em leilões realizados em 2014 e 2015, disse que pretende participar da disputa em setembro, mas evitou fazer comentários detalhados uma vez que a empresa ainda está estudando a nova metodologia de encadeamento dos lotes. Da mesma forma, o diretor corporativo do grupo espanhol ACS Industrial, Jaime LLopis, disse que quer continuar ativos nos certames. “Da nossa parte é um setor que temos vontade de continuar fazendo presença, mas estamos analisando essa inovação da maneira de apresentar os lotes.” A empresa sagrou-se vencedora de leilões em 2015 e em 2016. Em entrevista ao jornal Valor Econômico nesta semana, a gigante Taesa, veículo de investimentos em transmissão do grupo Cemig, também confirmou presença na disputa.
Um bom termômetro para saber o interesse dos participantes é olhar para as negociações que ocorrem nos bastidores. O diretor de GTD da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica, Newton Duarte, disse que está otimista. “Estamos detectando através de propostas para a indústria que novos players devem participar desse leilão.” “Estou vendo um interesse muito grande. O setor está mais ativo que o de geração.. No caso da transmissão, vejo um quadro mais estável e com oportunidades concretas”, concluiu.
Fonte: Wagner Freire, da Agência CanalEnergia, de São Paulo, Planejamento e Expansão